Ultimamente vários pacientes me perguntam sobre os famosos testes nutrigenéticos disponíveis no mercado.
Testes que "baseado" na detecção de alguns genes e polimorfismos consegue predizer qual o melhor tipo de dieta para cada indivíduo. Um grande avanço na nutrologia.
Mas será que realmente funcionam?
Será que há respaldo científico para se solicitar tais exames?
Afinal são caros e não saem por menos de 1800 reais o mais simples deles.
Por que será que não vemos geneticistas defendendo a utilização de tais exames ?
Inúmeras são as dúvidas. Acredito que seja uma área que está em franco avanço e daqui alguns anos poderemos utilizá-la. Mas AINDA não é a hora. O motivo ? Respondo com o parecer da Academy of Nutrition and Dietetics, que é uma entidade norte americana fundada em 1917 e que conta com mais de 75.000 membros, com participação de profissionais e estudantes na área de nutrição. Recentemente, ela publicou seu posicionamento frente a #GenômicaNutricional #Nutrigenética #Nutrigenômica e #TestesNutrigenéticos
Abaixo um texto publicado no site da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição
“A Academy of Nutrition and Dietetics” é uma entidade norte americana fundada em 1917 e que conta com mais de 75000 membros, com participação de profissionais e estudantes na área de nutrição. Recentemente, a Academia publicou um trabalho a respeito de seu posicionamento frente a “Genômica Nutricional”.
O texto traz uma ampla revisão sobre o assunto, abordando desde os principais resultados do Projeto Genoma Humano (PGH), as áreas de estudo da Genômica Nutricional, até as implicações éticas de sua aplicação na prática clínica.
O PGH foi um marco na história da ciência. Há aproximadamente 11 anos, a sequência completa do genoma humano foi publicada, promovendo impactos em diversas áreas do conhecimento, inclusive na Nutrição. Um dos principais resultados foi o fato de que o número de genes humanos é muito menor do que se estimava – entre 20 e 25 mil. A partir de então, o tempo e os custos para sequenciar um genoma humano estão sendo reduzidos continuamente e, espera-se que sua incorporação na prática médica torne-se realidade.
Genômica Nutricional é um termo amplo, que abrange a Nutrigenética, a Nutrigenômica e a Epigenômica Nutricional, as quais se referem a maneira como os nutrientes e os genes interagem e como estes se expressam para revelar os resultados fenotípicos, incluindo o risco de doenças. A Nutrigenética estuda a influência da variabilidade genética entre os indivíduos, a qual responsável pelas diferenças no estado de saúde e no risco de doenças, considerando os diferentes padrões de ingestão alimentar. A Nutrigenômica estuda a forma como as interações entre componentes da alimentação e genoma afetam o padrão de expressão gênica. Apesar destas delimitações, o termo Nutrigenômica muitas vezes é utilizado como sinônimo de Genômica Nutricional. Já a Epigenômica Nutricional se refere à influência da alimentação sobre mudanças na expressão gênica, mas sem que ocorram alterações na sequência do DNA.
Na Nutrigenética, as principais alterações estudadas são os polimorfismos de nucleotídeo único (SNPs), os quais são considerados variações normais no DNA e que consistem na troca de apenas um nucleotídeo em determinada região do DNA. Eles são responsáveis pelas diferenças observadas na cor dos olhos e cabelos, no tipo sanguíneo e alguns deles podem ter influência sobre o risco de desenvolvimento de determinadas doenças, muitas das quais podem estar associadas ao padrão alimentar individual. O texto do parecer destaca alguns SNPs relevantes que são relacionados à Nutrição, como é o caso do C677T no gene que codifica a enzima metilenotetra-hidrofolato redutase (MTHFR). Este SNP interfere no status de folato e de homocisteína e, potencialmente, no risco cardiovascular, na prevalência de defeitos do tubo neural e em outros riscos de doenças. Outros polimorfismos destacados encontram-se nos genes que codificam a fosfatidiletanolamina N-metiltransferase (PEMT) e a metilenotetra-hidrofolato desidrogenase 1 (MTHFD1), os quais estão relacionados a alterações no metabolismo da colina. Ainda, é referido que a associação mais estudada entre SNPs e doença é a relação entre o genótipo da apolipoproteína E (apoE) e a doença arterial coronariana (DAC). O papel do gene FTO (fat mass and obesity associated) sobre o risco de desenvolvimento de obesidade é citado, com ênfase no fato de que tal risco pode ser modificado por fatores ambientais, como a prática de exercícios físicos e a redução da ingestão energética. Neste aspecto, fica claro também que a vulnerabilidade genética à obesidade somente se expressa quando a exposição a fatores ambientais permite tal manifestação.
Com relação à Nutrigenômica, destaca-se que estudos de restrição energética e de modificações alimentares em indivíduos com sobrepeso e obesidade têm fornecido evidências de como os nutrientes afetam a expressão gênica. Tem sido demonstrado que quando estes indivíduos modificam seus padrões de alimentação, genes envolvidos com o metabolismo e com o fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-1) apresentam redução de expressão (down regulation). Efeitos de intervenções alimentares sobre o padrão de expressão gênica têm sido também aplicados em outras condições clínicas, como é o caso do câncer, com resultados promissores, porém muitas vezes conflitantes.
Por fim, a Epigenética refere-se a alterações herdáveis, porém que não promovem variações na sequência do DNA, mas que tem papel importante no controle da expressão gênica. Assim, a Epigenética é o processo que regula como e quando os genes são silenciados ou ativados e a Epigenômica é o estudo das alterações epigenéticas de uma célula. Os principais mecanismos epigenéticos de regulação da expressão gênica incluem hipo ou hipermetilação do DNA, alterações em histonas, silenciamento de genes por microRNAs e estabilidade cromossômica. Fatores relacionados à alimentação podem agir por meio de mecanismos epigenéticos ao longo da vida e se estender por gerações. É citado o exemplo dos indivíduos que foram expostos à privação alimentar intrauterina durante o Inverno Holandês da Fome (Dutch Hunger Winter), entre 1944 e 1945, e que na vida adulta apresentaram maior incidência de doenças crônicas, tais como esquizofrenia, diabetes melito tipo 2, DAC, hipercolesterolemia e alguns tipos de câncer.
Em diversos pontos do texto evidencia-se a preocupação em deixar claro que, apesar das fortes evidências de que a alimentação tem grande influência sobre o padrão de expressão gênica e que pode influenciar mecanismos epigenéticos, ainda há muitas questões sem respostas e que precisam ser elucidadas.
O parecer discorre sobre o aumento abrupto dos testes genéticos disponíveis no mercado, sobre os diferentes tipos de testes e sobre como a Genômica Nutricional poderia ser incorporada à prática clínica, deixando claro que os resultados destes testes podem fornecer informações úteis sobre o risco para desenvolvimento de doenças ou para manutenção da saúde de um indivíduo, sempre associados a outras informações, tais como história familiar, parâmetros bioquímicos e presença de fatores de risco para doenças (ex: obesidade, hipertensão arterial, hiperlipidemias).
O texto é finalizado com uma discussão sobre o nível de conhecimento acerca da Genômica Nutricional por parte dos Nutricionistas e destaca que conhecimentos sobre genética devem ser amplamente incorporados nos cursos de graduação em Nutrição e também em programas de residência. Com relação ao futuro da Genômica Nutricional, conclui-se que apesar de promissora na elaboração de planos alimentares personalizados com base no genótipo, esta ciência ainda está em desenvolvimento.
O posicionamento resumido é o seguinte: “A posição da Academia de Nutrição e Dietética é a de que a Genômica Nutricional fornece compreensão sobre como as interações entre alimentação e genótipo afetam o fenótipo. A aplicação prática da Genômica Nutricional em doenças crônicas complexas está em ascensão, porém ainda não é possível recomendar o uso de testes nutrigenéticos para fornecer aconselhamento nutricional na rotina da prática dietética. Nutricionistas devem ter habilidades básicas em genética como uma fundamentação para o entendimento da Genômica Nutricional; a competência requer conhecimentos e habilidades avançadas”. (tradução livre).
Versão para download em: http://www.andjrnl.org/article/S2212-2672(13)01783-8/fulltext
Por:
- Cristiane Cominetti: Professora da Faculdade de Nutrição da Universidade Federal de Goiás
- Renato Heidor: Pesquisador do Laboratório de Dieta, Nutrição e Câncer da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP
Comissão de Comunicação da Sociedade Brasileira de Alimentação e Nutrição – SBAN
Fonte: http://www.sban.org.br/por_dentro/informativos/71/posicionamento-da-the-academy-of-nutrition-and-dietetics-genomica-nutricional?fb_action_ids=654437174643590&fb_action_types=og.likes&fb_source=other_multiline&action_object_map=%5B926596364033905%5D&action_type_map=%5B%22og.likes%22%5D&action_ref_map=%5B%5D