Beber uma garrafa de vinho por semana pode ser como fumar cinco a 10 cigarros no mesmo período de tempo, em termos de risco de câncer, de acordo com um novo estudo do Reino Unido.
O estudo, publicado hoje (28 de março) na revista BMC Public Health , é o primeiro a estimar o “equivalente de cigarro” do álcool, no que diz respeito ao risco de câncer.
Os pesquisadores descobriram que o aumento do risco de câncer ligado a beber uma garrafa de vinho por semana é equivalente a fumar cinco cigarros por semana para homens e 10 cigarros por semana para mulheres.
O objetivo da pesquisa é transmitir melhor os riscos de câncer que estão ligados ao consumo moderado de álcool, que geralmente é considerado menos prejudicial do que fumar cigarros.
De fato, estudos nos EUA e no Reino Unido descobriram que muitas pessoas não estão cientes da relação do álcool com o câncer.
Por exemplo, uma pesquisa de 2017 da Sociedade Americana de Oncologia Clínica descobriu que 70% dos americanos não sabiam que o consumo de álcool é um fator de risco para o câncer .
“Nossa estimativa de um equivalente de cigarro para álcool fornece uma medida útil para comunicar possíveis riscos de câncer que exploram mensagens históricas bem-sucedidas sobre o fumo”, disse a autora do estudo, Theresa Hydes, do Departamento de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital Universitário Southampton, disse em um comunicado . “Esperamos que, ao usar o cigarro como comparador, possamos comunicar essa mensagem de forma mais eficaz para ajudar os indivíduos a fazer escolhas de estilo de vida mais informadas.”
O Dr. Richard Saitz, especialista em medicina do vício e presidente do Departamento de Ciências da Saúde Comunitária da Escola de Saúde Pública da Universidade de Boston, disse que a comparação do estudo faz sentido.
“Acho que é hora de comunicarmos os riscos de câncer do álcool – está realmente fora do radar [e] desta forma é uma boa maneira de fazê-lo”, disse Saitz, que não esteve envolvido no estudo.
Ainda assim, os pesquisadores ressaltam que o estudo não está dizendo que o consumo moderado de álcool é o mesmo que fumar. O estudo considerou apenas o risco de câncer, e não os riscos de outras condições de saúde, como doenças cardíacas. Além disso, o estudo analisou o risco de câncer ao longo da vida na população em geral, que pode diferir do risco de câncer de um indivíduo de fumar ou álcool, disseram os autores.
Álcool versus cigarros
Quando jovens começam a universidade, frequentemente ganham peso. Nos Estados Unidos, existe um nome para esse fenômeno: o “calouro 7”, referindo-se aos 7 quilos tipicamente ganhos durante o primeiro ano de vida dos alunos fora de casa.
Em parte, esse ganho de peso pode ser explicado pela substituição de refeições caseiras por comida pronta e fast food, combinada à redução da atividade física.
Cada vez mais, no entanto, os cientistas estão culpando um outro fator: a ruptura do círculo circadiano, provocada por uma cultura de comer tarde, beber e por padrões inconsistentes de sono.
Por décadas, nos foi dito que o ganho de peso, juntamente com as consequentes doenças, como diabetes tipo 2 e doenças cardíacas, estavam relacionadas exclusivamente à quantidade e ao tipo de alimentos que consumimos, em consonância com o número de calorias que gastamos fazendo exercícios físicos.
Mas evidências crescentes sugerem que o horário também é importante: não é apenas o que você come, mas quando você come, que importa.
A ideia de que nossa resposta biológica aos alimentos varia ao longo do dia é antiga. Médicos chineses acreditavam que a energia fluía em torno do corpo em sintonia com o movimento solar, e que as nossas refeições deveriam ser realizadas de acordo: 7h-9h da manhã era a hora do estômago, momento em que a maior refeição do dia deveria ser feita; 9h-11h da manhã centrada no pâncreas e no baço; 11h-13h a hora do coração, e assim por diante. O jantar, eles acreditavam que deveria ser algo leve, consumido entre 17h e 19h, quando a função renal predominava.
Embora a explicação seja diferente, a ciência moderna sugere que há muita verdade nessa antiga sabedoria.
Vamos às dietas. A maioria delas gira em torno da redução do número total de calorias consumidas – mas e se o horário também determinasse seus benefícios?
Quando mulheres com sobrepeso e obesas foram submetidas a uma dieta para emagrecer por três meses, aquelas que consumiram a maior parte das calorias no café da manhã perderam duas vezes e meia mais peso do que as que tomaram um café da manhã leve e comeram a maior parte das calorias no jantar. Mesmo consumindo o mesmo número total de calorias.
Muitas pessoas pensam que a razão pela qual você ganha mais peso se comer tarde da noite é porque tem menos oportunidades de queimar essas calorias, mas essa é uma visão simplista.
“As pessoas às vezes supõem que nossos corpos param durante o sono, mas isso não é verdade”, diz Jonathan Johnston, da Universidade de Surrey, no Reino Unido, que estuda como nossos relógios biológicos interagem com os alimentos.
Então, o que mais poderia estar acontecendo? Algumas evidências preliminares sugerem que uma quantidade maior de energia é usada para processar uma refeição pela manhã, em comparação com o final do dia.
Você queima, portanto, um pouco mais de calorias se comer mais cedo. No entanto, ainda não está claro o quanto isso faz diferença no seu peso total.
Outra possibilidade é que ao comer muito tarde nós ampliamos o período do dia durante o qual consumimos alimentos.
Isso dá ao nosso sistema digestivo menos tempo para se recuperar e reduz a oportunidade de nosso corpo queimar gordura – a queima de gordura só ocorre quando nossos órgãos percebem que não há mais comida chegando.
Antes da invenção da luz elétrica, os seres humanos acordavam com os primeiros raios de sol e dormiam logo após ele se pôr. Sendo assim, quase todos os alimentos eram consumidos diurnamente.
“A menos que tenhamos acesso à luz, temos dificuldade para ficar acordados e comer na hora errada”, diz Satchin Panda, biólogo circadiano do Instituto Salk, em La Jolla, Califórnia, nos Estados Unidos, e autor de The Circadian Code (O Código Circadiano, em tradução livre).
Sua pesquisa revelou que a maioria dos americanos come durante um período de 15 ou mais horas por dia, com mais de um terço das calorias diárias sendo consumidas após as 18h, o que é muito diferente de como nossos ancestrais provavelmente viviam.
Agora, considere esses universitários, comendo e bebendo até tarde da noite. “Um estudante universitário típico raramente dorme antes da meia-noite e também costuma comer até a meia-noite”, diz Panda.
No entanto, muitos estudantes ainda precisarão acordar cedo para as aulas no dia seguinte, o que – supondo que eles tomem o café da manhã – reduz a duração do jejum noturno ainda mais.
Isso também significa que eles estão diminuindo as horas de sono, e assim ficam mais propensos a ganhar peso. Uma noite de sono ruim dificulta a tomada de decisões e o autocontrole, levando potencialmente a más escolhas alimentares. Além disso, prejudica os níveis dos “hormônios da fome”, leptina e grelina, aumentando o apetite.
Está cada vez claro que nossos ritmos circadianos estão intimamente ligados à nossa digestão e metabolismo de muitas formas, como através dos complexos sistemas de sinalização do corpo – um novo entendimento que poderia explicar os efeitos a longo prazo do jetlag e do trabalho em turnos.
Dentro de cada célula do nosso corpo existe um relógio molecular que regula praticamente todos os processos e comportamentos fisiológicos, desde a liberação de hormônios e neurotransmissores, passando pela pressão sanguínea e pela atividade de nossas células imunológicas, até quando nos sentimos mais sonolentos, alertas ou deprimidos.
Esses relógios são mantidos em sincronia entre si e com a hora do dia por um grupo de neurônios do hipotálamo medial chamado núcleo supraquiasmático (NSQ). Sua interação como mundo exterior é feita através de um subconjunto de células sensíveis à luz na parte de trás do olho chamadas células ganglionares da retina intrinsicamente fotossensíveis (CGRif).
O objetivo de todos esses relógios “circadianos” é antecipar e preparar o corpo para eventos regulares em nosso ambiente, como quando vamos nos alimentar. Isso significa que diferentes reações bioquímicas são favorecidas em diferentes momentos do dia, permitindo que nossos órgãos internos mudem de tarefa e se recuperem.
Quando viajamos para o exterior, nosso tempo de exposição à luz muda e nossos relógios biológicos são empurrados na mesma direção – embora o relógio de cada órgão e tecido se adapte em ritmo diferente. O resultado é o jetlag, que não só nos deixa sonolentos ou acordados nos momentos errados, mas também pode desencadear problemas digestivos e mal-estar geral.
No entanto, a luz não é a única coisa que pode afetar nossos relógios biológicos. O horário em que comemos nossas refeições também modifica nossos relógios do fígado e sistema digestivo, mesmo que nosso relógio cerebral não seja afetado. Evidências recentes também sugerem que o horário das atividades físicas pode ajustar os relógios em nossas células musculares.
Quando voamos de um fuso horário para outro, ou comemos, dormimos e nos exercitamos em horários irregulares, os diferentes relógios em nossos órgãos e tecidos saem de sincronia. É improvável que isso seja um problema se você se deitar tarde uma única vez ou se tiver uma refeição tardia, mas se isso acontecer de forma regular, pode acarretar consequências para sua saúde no longo prazo.
Processos complexos, como o metabolismo de gorduras ou de carboidratos, exigem o trabalho conjunto de numerosos outros processos que ocorrem no intestino, fígado, pâncreas, músculo e tecido adiposo. Se o diálogo entre eles fica desregulado, se tornam menos eficientes, o que no longo prazo pode aumentar o risco de várias doenças.
Em um estudo recente, pesquisadores compararam os efeitos físicos de um sono de cinco horas por noite durante oito dias seguidos, com a mesma quantidade de sono, mas em momentos espaçados.
Em ambos os grupos, a sensibilidade das pessoas ao hormônio insulina diminuiu e a inflamação sistêmica aumentou, e com isso o risco de desenvolver diabetes tipo 2 e doenças cardíacas. No entanto, esses efeitos foram ainda maiores naqueles que estavam dormindo em horários irregulares (e cujos ritmos circadianos estavam, portanto, desalinhados): nos homens, a redução na sensibilidade à insulina e o aumento da inflamação dobraram.
Isso pode ser um problema para os passageiros aéreos frequentes, os estudantes que dormem de maneira não regular ou funcionários que trabalham em turnos.
De acordo com pesquisas na Europa e na América do Norte, cerca de 15% a 30% da população ativa está empregada em trabalhos divididos por turnos, o que muitas vezes equivale a comer ou estar ativo quando o corpo não está esperando. O trabalho por turno tem sido associado a uma série de condições, incluindo doenças cardíacas, diabetes tipo 2, obesidade e depressão. O distúrbio circadiano causado por essa irregularidade é um dos principais suspeitos.
No entanto, somos todos trabalhadores por turnos pelo menos em parte do tempo, diz Panda.
Estima-se que 87% da população mantêm um horário de sono diferente nos dias de semana, em comparação com os fins de semana, resultando em uma espécie de jetlag social. As pessoas também tendem a tomar o café da manhã pelo menos uma hora mais tarde nos fins de semana, o que pode resultar no chamado jetlag metabólico.
Não é apenas a consistência no horário das refeições, mas também a quantidade de comida que comemos em cada refeição que parece ser importante.
Gerda Pot é uma pesquisadora de nutrição da Universidade King’s College, em Londres, no Reino Unido. Ela pesquisa como a irregularidade cotidiana na ingestão de energia afeta nossa saúde a longo prazo.
Pot diz ter se inspirado em sua avó, Hammy Timmerman, que era rigorosa com a rotina. Todo dia, ela tomava café da manhã às 7h da manhã; almoçava às 12h30 e jantava às 18h00. Até mesmo o horário de seus lanches era rígido: café às 11h30; chá às 15h da tarde. Quando Pot foi visitá-la, logo descobriu que dormir até tarde era um erro: “Se eu acordasse às 10h, ela ainda insistiria que eu comesse o café da manhã, e tomasse café com biscoitos meia hora depois”, diz ela. Porém, está cada vez mais convencida de que a rotina rígida de sua avó ajudou a mantê-la em boa forma até quase seus 95 anos.
Existem algumas razões para isso. Nossa sensibilidade ao hormônio insulina, que permite que a glicose dos alimentos ingeridos entre em nossas células seja usada como combustível, é maior durante a manhã do que à noite.
Quando nos alimentamos tarde (como Hammy Timmerman nunca fez), a glicose permanece no sangue por mais tempo, o que no longo prazo pode aumentar o risco de desenvolver diabetes tipo 2, quando o pâncreas não produz insulina suficiente.
Também pode danificar outros tipos de tecidos, como vasos sanguíneos ou nervos dos olhos e nos pés. Nos piores casos, pode causar cegueira ou até mesmo amputações.
Usando dados de uma pesquisa nacional do Reino Unido que rastreou a saúde de mais de 5 mil pessoas por mais de 70 anos, Pot descobriu que, apesar de consumirem menos calorias em geral, as pessoas que tinham uma rotina de refeições mais irregular tinham maior risco de desenvolver síndrome metabólica – um conjunto de condições, incluindo hipertensão arterial, níveis elevados de açúcar no sangue, excesso de gordura na cintura e níveis anormais de gordura e colesterol no sangue, que juntos aumentam o risco de doenças cardiovasculares e diabetes tipo 2.
ENTÃO, O QUE DEVEMOS FAZER?
Esforçar-se por uma maior consistência no tempo de sono e refeições é um bom primeiro passo e, idealmente, todos os nossos relógios internos devem estar operando no mesmo fuso horário.
Quando abrimos as cortinas e vemos a luz forte de manhã, isso reinicia o relógio principal no nosso cérebro. Portanto, ao tomar o café da manhã logo em seguida, isso reforça a mensagem da manhã para os relógios do fígado e sistema digestivo. Comer um bom café da manhã pode, portanto, ser essencial para manter nossos relógios circadianos funcionando em sincronia.
Um estudo recente envolvendo 18 indivíduos saudáveis, e 18 com diabetes tipo 2, descobriu que pular o café da manhã ocasiona ritmos circadianos alterados em ambos os grupos, bem como picos maiores nos níveis de glicose no sangue quando eles finalmente se alimentavam.
No entanto, regular nossos horários internos não deve ser feito às custas de menos horas de sono. Apesar de ser improvável que dormir tarde ocasionalmente cause algum mal, geralmente devemos nos esforçar para ir para a cama em um horário que nos permita dormir o suficiente – a quantidade recomendada é de sete a oito horas para a maioria dos adultos – todos os dias da semana. Aqui, a exposição à luz poderia ajudar.
Diminuindo as luzes à noite e aumentando a exposição à luz intensa durante o dia mostrou que a hora do relógio principal no cérebro (o SQN) mudou várias horas antes, tornando as pessoas mais bem-humoradas.
Alguns defendem jejuar por pelo menos 12 horas, e possivelmente por até 14-16 horas durante a noite. Em um estudo histórico publicado em 2012, Panda e seus colegas compararam um grupo de ratos que tinha acesso a alimentos gordurosos e açucarados a qualquer hora do dia ou da noite, com outro grupo que só consumia esses alimentos em uma janela de oito a 12 horas durante o “dia”.
Mesmo consumindo o mesmo número de calorias, os camundongos cuja janela de alimentação era restrita pareciam estar completamente imunes às doenças que começaram a afligir o outro grupo: obesidade, diabetes, doenças cardíacas e problemas no fígado.
No entanto, ao serem colocados em um cronograma de restrição de tempo, os ratos com essas doenças ficaram bem novamente.
“Quase todos os animais, incluindo nós, evoluíram neste planeta com um ritmo muito forte de 24 horas, entre luz e escuridão, e os ritmos associados em comer e jejuar”, explica Panda.
“Achamos que uma das principais funções [desses ciclos] é permitir a recuperação e o rejuvenescimento a cada noite. Você não pode consertar uma rodovia quando o tráfego ainda está em movimento.”
Testes em humanos com restrição de tempo alimentar estão apenas começando, mas alguns dos primeiros resultados parecem promissores – pelo menos em alguns grupos. Por exemplo, quando oito homens com pré-diabetes foram induzidos a comer todas as suas refeições entre 8h e 15h, sua sensibilidade à insulina melhorou e sua pressão caiu em média 10 a 11 pontos, em comparação a quando eles consumiram as mesmas refeições em um intervalo de 12 horas.
O que tudo isso significa para o resto de nós ainda não está claro, mas o ditado de que você deveria tomar café da manhã como um rei, almoçar como um príncipe e jantar como um mendigo nunca fez tanto sentido. E é quase certeza que vale a pena colocar um cadeado na geladeira durante a noite.
“Compartilhar é se importar”
Instagram:@dr.albertodiasfilho
Fonte: https://f5.folha.uol.com.br/viva-bem/2019/03/como-o-horario-das-refeicoes-afeta-a-sua-cintura.shtml?utm_source=whatsapp&utm_medium=social&utm_campaign=compwa
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