Os medicamentos para perda de peso se tornaram extremamente populares nos últimos anos, principalmente porque eles de fato funcionam. Pacientes que usam agonistas do receptor do peptídeo 1 glucagonoide (GLP-1), como liraglutida, semaglutida e tirzepatida — esta última também agonista do polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP) — podem perder 10%, 20% ou até mesmo 25% do peso corporal.
Entretanto, se esses pacientes pararem de tomar o agonista do receptor de GLP-1, eles tendem a recuperar grande parte desse peso em até um ano, segundo estudos.
“Esses fármacos atuam biologicamente no organismo levando à alteração do apetite”, disse o endocrinologista Dr. Robert Kushner, especialista em medicina da obesidade e professor vinculado à Northwestern University Feinberg School of Medicine, nos Estados Unidos. “Sendo assim, quando o medicamento é retirado, a doença retorna.”
O tratamento contínuo pode parecer a solução óbvia, mas a realidade não é tão simples. Em muitos casos, os custos elevados, as falhas no abastecimento e a falta de cobertura pelos planos de saúde podem tornar esses medicamentos inacessíveis.
Frequentemente, "as seguradoras dizem aos pacientes que não cobrirão mais os agonistas do receptor de GLP-1 para o tratamento da obesidade", disse a Dra. Carolyn Bramante, que é médica, mestre em saúde pública e professora assistente na University of Minnesota Medical School, nos EUA. Ela também atende pacientes na clínica M Health Fairview, especializada no controle de peso.
Outras barreiras são os efeitos colaterais dos medicamentos, como náuseas, diarreia, dispepsia e vômitos. Além disso, alguns pacientes simplesmente não querem tomar um medicamento por toda a vida, optando por arriscar e tentar manter o peso reduzido sem o tratamento farmacológico.
Se o seu paciente precisar interromper o uso do agonista do receptor de GLP-1 ou desejar parar de tomar o medicamento, veja a seguir algumas dicas de como ajudá-lo.
Descubra o que está por trás do desejo de interromper o tratamento. Converse com o paciente e peça que ele te ajude a entender a situação, sugeriu o Dr. Jaime Almandoz, médico, professor associado de medicina interna e diretor clínico no Programa de Bem-Estar Relacionado ao Peso do University of Texas Southwestern Medical Center, nos EUA. Às vezes, o paciente ou seus familiares estão preocupados com aspectos relacionados à segurança do medicamento, disse o Dr. Jaime. “Eles podem estar preocupados com os riscos [do tratamento] e talvez não tenham tido a oportunidade de fazer perguntas.” O Dr. Jaime sempre analisa os dados de segurança dos medicamentos e relata que os estudos mostram que, em média, os pacientes recuperam dois terços do peso perdido em até um ano. Você não está tentando persuadi-los, mas, sim, capacitá-los para que façam uma escolha bem-fundamentada.
Não deixe o preconceito afetar as decisões terapêuticas. Os pacientes que usam agonistas do receptor de GLP-1 costumam perguntar: “Por quanto tempo vou ter de tomar esse remédio?”. O motivo por trás desse questionamento é que “tendemos a acreditar que [a obesidade] não é um estado patológico, mas uma falha de caráter”, disse o Dr. Sean Wharton, médico, doutor em farmacologia e diretor clínico na Wharton Medical Clinic, no Canadá, especializada no controle de peso. Lembre o seu paciente de que a obesidade não é uma falha pessoal, mas uma mistura complexa de fatores genéticos e biológicos.
Oriente sobre os aspectos biológicos básicos da obesidade. A ciência mostra que, quando perdemos peso, nosso corpo reage, tentando retornar ao estado de maior massa gorda. Mudanças em neuro-hormônios, hormônios intestinais, mecanismos de saciedade, metabolismo e função muscular convergem para promover a recorrência do ganho de peso, disse o Dr. Jaime. Para explicar esses processos aos pacientes, ele compara o ganho de gordura ao ato de depositar dinheiro em uma poupança. “Quando tentamos perder peso, não é tão simples como sacar dinheiro”, ele diz aos pacientes. “É quase como se o dinheiro que colocamos na poupança estivesse agora vinculado a investimentos e não pudesse ser resgatado tão facilmente.”
Prepare os pacientes para um aumento no apetite. Quando os pacientes param de tomar o agonista do receptor de GLP-1, a fome e a fissura por alimentos tendem a aumentar. “Eu explico que os medicamentos imitam um hormônio liberado pelo intestino quando ele ‘percebe’ que comemos”, disse o Dr. Jaime. Isso sinaliza ao cérebro e ao organismo que existe alimento no trato gastrointestinal, diminuindo o apetite e fissura por comida. Pergunte aos pacientes como é a sensação de fome e saciedade com o uso do medicamento, sugeriu o Dr. Jaime. “Muitos dirão que têm pouca fome e poucas fissuras, e que atualmente sentem indiferença em relação aos alimentos”, disse ele. Essas perguntas podem ajudar os pacientes a se tornarem mais cientes dos efeitos do agonista do receptor de GLP-1. “Isso proporciona um diálogo mais claro caso esses medicamentos sejam suspensos”, disse o Dr. Jaime.
Ajude o organismo dos pacientes a se ajustar. “Se possível, reduza lentamente a dose, para evitar um grande [efeito] rebote na fome”, disse a Dra. Carolyn. Se o seu paciente tiver tempo (digamos que ele recebeu uma carta do plano de saúde informando que a cobertura do medicamento será suspensa em três meses), use esse período para reduzir gradualmente a dose para o menor nível possível antes da retirada completa. Quanto mais lenta e gradual for a suspensão, melhor. O Dr. Jaime avalia os pacientes em intervalos de quatro a oito semanas. Se os indivíduos estiverem mantendo o peso, ele considera diminuir a dose novamente e continuar a redução em consultas de acompanhamento.
Substitua uma intervenção por outra. Em geral, manter o peso perdido exige alguma intervenção, disse o Dr. Sean. “Porém, essa intervenção não precisa ser a mesma que levou à perda de peso [inicial].” Se o paciente não puder continuar com o agonista do receptor de GLP-1, considere o uso de um medicamento alternativo, da terapia cognitivo-comportamental ou uma combinação dos dois. Em alguns casos, quando os pacientes perdem a cobertura dos agonistas do receptor de GLP-1, a Dra. Carolyn prescreve um medicamento mais antigo e mais barato, como fentermina, topiramato ou metformina. Além disso, em algumas situações, as seguradoras que não cobrem os agonistas do receptor de GLP-1 (como o Medicare, seguro-saúde pago pelo governo federal dos EUA a pacientes idosos ou vulneráveis) cobrem a cirurgia bariátrica, que pode ser uma opção, dependendo do índice de massa corporal, da saúde geral e das comorbidades do paciente, disse o Dr. Jaime.
Crie um ‘modelo de hábitos’. Normalmente, o Dr. Robert solicita aos pacientes que perderam peso de forma bem-sucedida que façam um diário de tudo o que estão fazendo, com o objetivo de apoiar seus esforços. O médico pede que eles descrevam como planejam sua dieta, que tipos de alimentos comem, quanto e quando. Além disso, ele também pergunta sobre atividade física, padrões de exercícios e sono. Em seguida, ele registra todos esses hábitos em uma lista e entrega uma versão impressa ao paciente antes do término da consulta. “Esse é o seu modelo”, ele diz. "É isso que você vai tentar manter da melhor forma possível, pois é o que funciona no seu caso."
Prescreva exercícios físicos. “O aumento da prática de exercícios normalmente não é eficaz na perda de peso inicial, mas é importante para manter a perda”, disse a Dra. Carolyn. Oriente os pacientes a começarem imediatamente, de preferência enquanto ainda estiverem tomando o medicamento. Em um estudo publicado em fevereiro de 2024, pacientes que tomavam liraglutida (Saxenda) e se exercitavam quatro dias por semana tinham muito mais chances de manter o peso após interromperem o uso do medicamento do que aqueles que não faziam exercícios. (O estudo foi parcialmente financiado pela Novo Nordisk Foundation, organização filantrópica vinculada à Novo Nordisk, fabricante do Saxenda e da semaglutida [Ozempic e Wegovy].) Ao estabelecer fortes hábitos relacionados ao exercício físico enquanto tomavam o medicamento, esses indivíduos conseguiram manter níveis mais elevados de atividade física após pararem de tomar o agonista do receptor de GLP-1. Peça ao paciente para identificar alguém ou algo para ajudá-lo a seguir o plano, “seja procurando um treinador ou se comprometendo com um amigo, um familiar ou consigo mesmo por meio de registros diários”, disse o Dr. Robert. Saiba mais sobre como prescrever exercícios para os seus pacientes.
Ajude-os a criar um ‘microambiente’ favorável. O Dr. Robert costuma perguntar aos pacientes quais dos hábitos alimentares recomendados para a perda de peso são mais difíceis de seguir: comer mais vegetais? Cortar ultraprocessados, alimentos gordurosos, fast food e/ou bebidas açucaradas? Dependendo das respostas do paciente, ele tenta recomendar estratégias — talvez ficar sem carne alguns dias por semana ou manter alimentos tentadores fora de casa. “Se o paciente parar de tomar o medicamento, os alimentos podem se tornar mais atraentes e ele pode não se sentir tão satisfeito comendo menos”, disse o Dr. Robert. "Certifique-se de que o que chamamos de microambiente, ou seja, o ambiente doméstico, esteja repleto de alimentos saudáveis."
Use a experiência multidisciplinar a seu favor. A obesidade é uma doença complexa e multifatorial, por isso chame reforços. “Quando atendo alguém, estou sempre avaliando quais outros membros da equipe poderiam ajudá-lo”, disse o Dr. Robert. Se o paciente não tiver um bom conhecimento nutricional, o médico o encaminha para o nutricionista. Se houver problemas relacionados a autoculpa, baixa autoestima e alimentação emocional, o indivíduo é encaminhado ao psicólogo. Isso pode fazer a diferença. Um estudo de 2023 mostrou que os pacientes que perderam peso e receberam o apoio de profissionais como treinadores físicos, nutricionistas e psicólogos recuperaram menos peso ao longo de dois anos, em comparação com aqueles que não receberam essa mesma assistência.
Tranquilize os pacientes e diga que você irá ajudá-los, não importa o que aconteça. Peça aos pacientes que retornem um mês após a suspensão do medicamento ou que entrem em contato antes disso se ganharem 2,5 kg. Os pacientes que param de tomar um agonista do receptor de GLP-1 geralmente relatam que estão menos satisfeitos ao comer ou que pensam mais em comida. É nesse momento que o Dr. Robert pergunta se eles querem voltar a tomar o medicamento ou preferem focar em outras estratégias. Às vezes, os pacientes que ganham peso ficam constrangidos e adiam as consultas de acompanhamento. Se isso acontecer, acolha esses indivíduos e diga a eles que todas as doenças crônicas vão e vêm. “Lembro os pacientes constantemente de que estou aqui para ajudá-los e que existem muitas ferramentas ou recursos que irão auxiliá-los”, disse o médico. "Além disso, busco desfazer o pensamento de que, de alguma forma, a culpa é deles."
O Dr. Robert Kushner informou atuar como membro do conselho consultivo ou consultor nas empresas Novo Nordisk, WeightWatchers, Eli Lilly and Company, Boehringer Ingelheim, Structure Therapeutics e Altimmune. Ele acrescentou que não possui ações de nenhuma dessas empresas nem participa de nenhum grupo de palestrantes. O Dr. Jaime Almandoz informou atuar como membro do conselho consultivo das empresas Novo Nordisk, Boehringer Ingelheim e Eli Lilly and Company. O Dr. Sean Wharton informou atuar como membro do conselho consultivo e receber remunerações para palestras acadêmicas e pesquisas clínicas das empresas Novo Nordisk, Eli Lilly and Company, Boehringer Ingelheim, Amgen, Regeneron e BioHaven.
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