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terça-feira, 29 de novembro de 2022

O ciclo circadiano do recém-nascido e o aleitamento materno

A crononutrição tem como objetivo ajustar a qualidade da nutrição e a ingestão para coordenar o relógio biológico de um indivíduo, de modo que se consuma o tipo e a quantidade de alimentos na hora do dia mais ideal. A maior parte da compreensão atual da crononutrição surgiu de estudos em adultos e, portanto, não abrange o tempo de vida dos bebês.

No útero, o feto é exposto por aproximadamente 9 meses aos ritmos circadianos, fisiológicos, metabólicos e comportamentais da mãe. Este meio circadiano é abruptamente interrompido após o nascimento, mas a natureza desenvolveu a substituição perfeita, o leite materno, cuja composição muda de acordo com os ritmos circadianos da mãe. Não surpreendentemente, em humanos, o recém-nascido ingere leite durante o dia e a noite, e os componentes nutritivos e não nutritivos mudam de acordo com esses horários.

Após o nascimento, o recém-nascido é exposto a uma variedade de manipulações e mudanças ambientais e o tempo de estabelecimento dos ritmos circadianos de glicocorticoides, melatonina, repouso diurno/noturno e o ritmo do sono variam amplamente dos 3 aos 6 meses de idade. Em um estudo em que a criança foi amamentada sob livre demanda durante o dia e a noite e exposta à luz apenas durante o dia, os ritmos circadianos de temperatura, sono/vigília e melatonina foram detectados durante a primeira semana e aos 30 e 45 dias de vida, respectivamente, sendo mais cedo do que a maioria dos estudos. O acúmulo de evidências revela os benefícios das mudanças nos componentes do leite e nas condições ambientais para o bebê.

Estudos que avaliaram a relação do leite materno, ciclo circadiano e seu impacto no bebê e concluíram que:
  • O triptofano, guanosina, uridina e melatonina presentes no leite humano durante a noite melhoraram o sono infantil e ajudaram a consolidar seu ciclo sono/vigília;
  • A vitamina B12 pode melhorar o sono em crianças;
  • Existem substâncias cronobióticas no leite que contribuem para o estabelecimento do ciclo sono-vigília do lactente;
  • Os bebês amamentados exclusivamente tiveram melhores parâmetros de sono em comparação com bebês alimentados com fórmula;
  • Os bebês com 2 meses de idade que foram amamentados, em contraste com bebês alimentados com fórmula, tiveram uma frequência significativamente menor de ataques de cólica e gravidade dos ataques de irritabilidade, o que foi associado ao consumo noturno de melatonina através do leite;
  • Os ritmos circadianos são importantes para o bem-estar dos lactentes e afeta severamente a sobrevida;
  • Os bebês que foram expostos à variação da condição claro/escuro e alimentados com leite materno apresentaram maior ganho de peso, melhor saturação de oxigênio, desenvolveram mais rapidamente um ritmo de melatonina e menor tempo de internação.
Esses estudos são exemplos da importância dos ritmos circadianos após o nascimento do bebê. 

Felizmente, a evidência convincente dos benefícios da exposição de bebês prematuros a um ciclo claro/escuro está levando as sociedades de cuidados neonatais a recomendar essa prática para aplicações clínicas.

Além disso, considerando que estamos no novembro roxo, mês de conscientização sobre o nascimento prematuro, vale destacar que a amamentação desde o nascimento é eficaz na prevenção da morte de bebês prematuros, em contraste com as práticas convencionais de cuidado.


Referência: Caba-Flores MD, Ramos-Ligonio A, Camacho-Morales A, Martínez-Valenzuela C, Viveros-Contreras R, Caba M. Breast Milk and the Importance of Chrononutrition. Front Nutr. 2022 May 12

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Evidência indicam que comer mais durante o período noturno pode favorecer obesidade, diabetes e outras doenças metabólicas

O texto abaixo foi escrito pelo Endocrinologista Dr. Bruno Halpern. Achei interessante repostar pois durante muitas décadas, principalmente nutricionistas, defendem que quando se trata de emagrecimento, o que importa é o volume calórico ingerido ao longo de todo dia.

Errada a informação não está, mas deve-se levar em conta o horário em que ingerimos os alimentos. Surgiu há algum tempo um ramo da Nutrição chamado Crononutrição. Nesse ramo estuda-se o papel dos alimentos no ciclo circadiano e vice-versa. Ou seja, o horário em que ingerimos determinados nutrientes importa. O ciclo circadiano pode alterar a forma que esses nutrientes são assimilados, metabolizados. Assim como os nutrientes podem alterar de forma indireta o ciclo circadiano. 

Assunto novo esse? Nem tanto. Antes de fazer Nutrologia, fiz pós em Medicina Tradicional Chinesa (2009-2011) e isso é algo que a Medicina Tradicional Chinesa há 5 mil anos fala. Não só a Medicina Chinesa como a Medicina Ayurvédica. As vezes, nós ocidentais, nos consideramos detentores da ciência e ignoramos o que práticas milenares pregam, por acharmos que são sem evidências. 

Com o passar das décadas, alguns dogmas caem por terra e nos levam a olhar com mais atenção para essas práticas milenares.

Na prática clínica, o que eu e meu nutricionista percebemos, é que a maioria dos pacientes com sobrepeso, sentem mais fome no período da tarde e noturno. Alguns com episódios de compulsão em um período crítico: 16h às 18h. E a predileção é principalmente por alimentos ricos em carboidratos simples e gorduras. Raramente por fontes de proteínas. 

O ajuste do plano alimentar, baseado em um recordatório alimentar de 24h e respeitando o ciclo circadiano, pode auxiliar no processo de emagrecimento. Redistribuir as calorias totais ao longo de 3 etapas, colocando uma quantidade menor no período noturno, pode potencializar resultados de alguns pacientes. É o que temos visto na nossa prática clínica. Mas nem todos os organismos funcionam da mesma maneira. Alguns precisa de um pouco mais de carboidrato no período noturno e isso é uma tentativa de erro e acerto. O nutrólogo e o nutricionista devem ser capacitados para saber manejar essas tentativas. 

Enfim, vale a pena a leitura do texto, pois as evidências da crononutrição sugerem que no período noturno o gasto energético para digerir os alimentos é menor. Além disso, alguns poucos trabalhos mostram que a sensibilidade à insulina é menor no período noturno. E além disso, na prática percebemos que a "fome emocional" é maior no período noturno. Mas isso é assunto para um longo post...




Há vários estudos que mostram que pessoas que concentram suas calorias à noite tem maior risco de obesidade, diabetes e outras doenças metabólicas, mas é sempre difícil saber se isto é uma relação de causa e efeito, isto é, comer à noite leva a essas doenças, ou é um fator de confusão, ou seja, quem come mais à noite pode também ter uma vida menos regrada, beber mais álcool, dormir pior, etc, e essa é a causa real da relação.
Muitos estudos tentam elucidar a essa questão avaliando parâmetros metabólicos em situações controladas e mostram que pode sim haver uma relação direta entre esses fatores.
Por exemplo, um estudo demonstrou que a mesma refeição, quando feita às 22:30, levava a um gasto energético de digestão (o chamado “efeito térmico da comida” ) 4% menor do que se feita às 18:30. Ou seja, comer mais tarde fez o corpo gastar menos energia para digerir a refeição. 4% parece pouco, mas pode ser significativo no longo prazo!

Além disso, muitos estudos em animais e alguns poucos em humanos também sugerem que quando comemos fora do nosso período ativo, o excesso de calorias não é corretamente armazenado como gordura e tende a se depositar em órgãos como fígado, músculo e coração, aumentando os riscos de diabetes e doenças cardíacas. É como se, à noite, o nosso aparato normal de armazenamento estivesse descansando, e assim, ao chegar comida, não há enzimas, hormônios e proteínas suficientes para levar essa gordura para o lugar certo!

Ainda há muito o que se estudar e aprender sobre o assunto em humanos, mas recomendar redução do consumo alimentar noturno a longo prazo é uma forma de promover saúde. Lembrando que excesso de calorias noturnas tb atrapalham o sono e sono ruim também está associado a ganho de peso é doenças metabólicas!

Referência:  McHill. Later circadian timing of food intake is associated with increased body fat. AJCN 2017.  https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5657289/

Autor: Dr. Bruno Halpern - Médico Endocrinologista e Metabologista.