Cresci em uma família repleta de médicos. Pai médicos, tios, primos. Uma Medicina pautada em hierarquia. Manda quem pode (médico), obedece quem tem juízo (paciente). A figura do médico sempre foi colocada em um pedestal, endeusada, como se ele fosse o detentor supremo do conhecimento técnico científico da Medicina.
Porém, a humanidade evolui. Com o advento da internet tivemos uma revolução da informação. Universalização do conhecimento e isso se por um lado foi péssimo por conta das fake news em saúde, por outro deu munição para os pacientes confrontarem médicos, questionarem o que antes era hierarquizado. Ou seja, se antes o médico "mandava" e o paciente "obedecia", hoje o paciente denominado Ativo e responsável, é portador de questionamentos sobre os seus sintomas, diagnóstico e tratamento.
Mas onde quero chegar com esse papo? Na obesidade.
Nenhuma outra doença, ao meu ver, precisa tanto de um paciente PAR. Mas na prática o que esses pacientes menos são é PAR. E o que seria um paciente PAR? Esse conceito muito difundido na Oncologia, também se enquadra na Nutrologia ou qualquer área que maneje doenças crônicas não transmissíveis.
O paciente com postura PAR: assume a responsabilidade pelo seu tratamento e pela sua vida ou no mínimo, uma grande parte desse processo. Ele percebe que tem voz ativa, motivações e precisa agir para lutar contra a obesidade.
Se a gente parte do pressuposto que a obesidade é uma Doença com 7 pontos primordiais:
- Crônica
- Recidivante
- Incurável
- Multifatorial na gênese
- Com forte componente genético, emocional
- Com necessidade de equipe multidisciplinar
- Abordagem nutricional, abordagem corporal (atividade física), medicamentosa e psicoterápica.
Entendemos que o paciente terá papel central no tratamento. Ou seja, ele precisa ser ativo e responsável. O papel do médico é dar as diretrizes, mas quem trilhará o caminho árduo será o paciente ativo e responsável.
E por que estou falando sobre isso? Simplesmente, porque quando se trata de obesidade, a maioria dos pacientes querem ser emagrecidos. A última coisa que a maioria quer é ser ativo e responsável durante o processo. Infelizmente negligenciam a cronicidade da doença e a necessidade de vigilância eterna. Ou seja, muitos preferem negar que a doença é incurável e que precisa de tratamento dietético, medicamentoso, atividade física e muitas vezes acompanhamento psicoterápico. Esse é o paciente opostos, o passivo e irresponsável (PPI).
Mas qual a finalidade de se ter uma postura PAR?
- Estar mais informado sobre a própria doença (obesidade).
- Ter um maior controle e participação nas escolhas e decisões. Qual abordagem dietética se enquadra mais na sua realidade financeira? Qual abordagem medicamentosa se encaixará melhor no seu padrão alimentar?
- Sentir-se mais seguro, confiante e preparado para enfrentar o tratamento e todas as decisões necessárias.
- Saber lidar com as reais expectativas, principalmente na elaboração de metas a serem atingidas.
- Assumir compromisso em seguir o que foi acordado: seja dieta, atividade física, uso de medicação. Check list de hábitos.
E como posso ser um paciente mais PAR?
- Diante do diagnóstico de obesidade, tenha calma e respire. Internalize que a obesidade é uma doença, que não tem cura, mas tem tratamento e controle.
- Essa doença impactará a sua vida e quanto mais precoce for a intervenção ( e duradoura), maiores as chances de sucesso. Durante um tempo, principalmente no primeiro ano, você sentirá que a vida perdeu o sentido, afinal fazer dieta não é legal. Principalmente para aqueles que possuem a comida como fonte central de prazeres.
- Leia sobre o tema, tenho um texto pautado em evidências científicas que ajuda os pacientes a terem um panorama melhor sobre a complexidade da obesidade: https://www.nutrologogoiania.com.br/doencas-e-a-nutrologia/obesidade/
- Informe-se sobre todas as abordagens terapêuticas da obesidade, o texto acima pode te ajudar. Quanto mais você aprende sobre obesidade, mais você se sentirá confiante. Eduque-se, não tenha medo da informação, mas também não acredite em qualquer informação na internet. A maioria das informações em saúde que estão nas redes sociais, YouTube, sites não são informações confiáveis. Não é porque o médico tem muitos seguidores que ele é um bom médico. Podem ser seguidores comprados. Busque o currículo do médico que você escolheu para chamar de "seu". Primeiro veja se ele é realmente especialista, ou seja, se ele tem Registro de qualificação de especialista (RQE) em Nutrologia ou Endocrinologia. Segundo, veja se ele propaga tratamentos milagrosos ou questionados/proibidos pelo Conselho Federal de Medicina. Aqui uma lista de coisas que não fazem parte da Nutrologia e muita gente acha que faz: https://abran.org.br/imprensa/comunicado/comunicado-sobre-o-rol-de-procedimentos
- Peça ao seu médico indicação de livros, sites, textos sobre o tema. Material que ele confia.
- Antes das consultas anote todas as suas dúvidas no whatsApp. Questione o seu médico. Não tenha vergonha de perguntar, as vezes dúvidas que parecem bobas, podem ser determinantes no seu sucesso.
- Solicite um número de telefone para que você possa ligar em casos de urgência.
- Seja transparente com o médico sobre o seu estilo de vida, realidade financeira e principalmente sobre seus sintomas. Você deve contar ao médico sobre o seu histórico de doenças familiares, o médico deve examiná-lo e solicitar exames, de acordo com o seu caso. Se ele pediu determinado exame, faça. Ou seja, assuma a responsabilidade de agendar seus exames, consultas médicas e buscar os resultados. Não espere que façam isso por você. Mas, caso esteja fragilizado saiba que você pode pedir ajuda a alguém do seu círculo e não precisa passar por tudo isso sozinho.
- Saiba que o planejamento semanal é um dos maiores determinantes do seu sucesso. Ou seja, tire um tempo para planejar as refeições.
- Seja realista em relação ao tempo para obter resultados. Não se compare com outras pessoas, você é único e cada pessoa responde de uma forma à dieta e medicações.
- Crie o hábito de preencher Check list de hábitos, o bom médico que lida com obesidade sabe da importância desses check lists e recordatórios alimentares.
- O Médico/Nutricionista/Profissional da Ed. física/Psicólogo podem até dar as orientações, mas quem trilhará o caminho é você. Ou seja, se você acha que será emagrecido, melhor rever suas expectativas, você é o polo Ativo, você é o PAR.
Autor: Dr. Frederico Lobo – Médico Nutrólogo – CRM-GO 13192 – RQE 11915 – CRM-SC 32949 – RQE 22416