Alerta ambiental e de interesse coletivo: Medicamentos nos rios e lagos – uma descoberta recente e assustadora, por Míriam Sommer
Pelo mundo afora, atualmente, os medicamentos poluem mais os rios do que as indústrias. Isto porque a contaminação industrial baixou muito em vários locais do mundo, porque muitas das indústrias se mudaram para a China e para o Japão, e pelo simples fato de que estão cumprindo melhor as normas que são ditadas a favor do meio ambiente.
Assim como o antidepressivo Prozac (fluoxetina) foi encontrado nas águas dos rios e lagos nos EUA e no Canadá, na Suécia foram encontrados diclofenaco (anti-inflamatorio), carbamazepina, propranolol (beta-bloqueador) e trimetropin e sulfametoxazol (antibióticos).
Um em cada quatro europeus reconhece que atira medicamentos pelo lavabo. Sabe-se que não são substâncias que se degradam facilmente e as plantas aquáticas depuradoras não estão preparadas para fazê-lo. O resultado é que os rios europeus contêm, cada vez mais, maior quantidade de fármacos. Nas águas do rio Ebro, na Espanha, foram detectados 20 remédios diferentes.
Um estudo científico espanhol identificou a presença de 20 medicamentos nas águas do Ebro. Analgésicos, anti-inflamatórios, antidepressivos, antibióticos e anti-histamínicos viajam pela corrente do rio em concentrações suficientes para ocasionar efeitos adversos nos peixes e nos organismos aquáticos. Em princípio não se prevê que esta contaminação vá ter efeitos negativos diretos sobre a saúde das pessoas. Os cientistas estão preocupados com a presença maciça de antibióticos, que induzem a resistência aos microorganismos. Também produzem inquietação os estrógenos, capazes de produzir modificações no sexo dos peixes e alterações metabólicas nos humanos, como já foi demonstrado em vários estudos prévios.
Gemfibrozil, diclofenaco, carbamezapina, ibuprofem...
A água do rio Ebro está cheia destes e de muitos outros compostos.
“Como estes remédios foram parar no rio?”
-“Através do lavabo”, é a simples resposta dada por Damián Barceló, cientista e diretor do Instituto Catalão de Investigações da Água (ICRA), responsável pelo estudo junto ao Conselho Superior de Investigações Científicas e autor do estudo Ocorrência e distribuição de fármacos na água superficial, em sólidos em suspensão e sedimentos na bacia do rio Ebro, publicado na revista Chemosphere.
“Existem muitos fármacos cujo composto ativo sobrevive ao metabolismo humano e é excretado em uma proporção muito elevada”, explica o cientista catalão. Além do mais, apesar de todas as campanhas de informação realizadas pelas administrações sanitárias, as pessoas continuam a se desfazer dos medicamentos atirando-os ao esgoto.
Sabe-se que 25% dos europeus eliminam os seus remédios pelo esgoto, segundo pesquisas realizadas. Sabe-se que as concentrações medicamentosas encontradas no rio Ebro são similares às encontradas nos rios Danúbio e Elba.
As depuradoras de águas residuais não estão preparadas para tratar deste tipo de substâncias. Em alguns casos, a percentagem do composto que se elimina durante o processo de depuração pode ser inferior a 10% do volume que contém a água.
Para seguir a pista dos medicamentos, a equipe de Barcelona estabeleceu 18 estações de amostragem ao longo do Ebro, desde Álava até Tortosa. De acordo com os dados recolhidos até agora, as estações que mostram os níveis mais altos de fármacos na água são as situadas no rio Huerva, no rio Galego.
Em todas as estações, as concentrações de medicamentos na água do rio chegam a cerca de 600 nanogramos por litro (ng/L).
O tipo de medicamento mais detectado varia de uma estação à outra. As maiores concentrações de medicamentos psiquiátricos se dão em Villodas (Álava) e Puente la Reina (Navarra), seguidos por Huerva e Presa de Pina (Zaragoza). Ao contrário, a presença de antibióticos como eritromicina, azitromicina e trimetropim é bastante homogênea.
Os investigadores estão tentando averiguar como este cocktail de medicamentos afeta a saúde dos seres vivos, pois se sabe muito pouco sobre este assunto, em se tratando de um campo muito novo.
Recentemente, um grupo de investigadores da Universidade de Constance (na Alemanha) comprovou que o diclofenaco – um anti-inflamatório de uso frequente em toda Europa – produz danos ao fígado e aos rins das trutas. Vinte e um dias de exposição ao diclofenaco pode causar necrose tubular nos rins, teleangectasia e diversas alterações renais e hepáticas nos animais.
Uma das principais conclusões do referido estudo, publicado em outubro de 2005 na revista Aquatic Toxicology, refere-se aos efeitos adversos produzidos pelo diclofenaco, concentrações estas similares às encontradas habitualmente nas regiões fluviais, e que são concentrações muito baixas.
Por outro lado, teríamos que beber um milhão de litros da água do rio para se chegar a tomar um só comprimido de ibuprofeno.
Os peixes que vivem perto da saída da água depurada recebem um verdadeiro banho de fármacos. A equipe de Barcelona crê que existem conseqüências a longo prazo: “Os peixes, os anfíbios, as plantas etc. estão expostos cada dia, de forma contínua. A longo prazo, a diversidade pode ser alterada”.
Os antibióticos são os compostos que mais preocupam em relação com a saúde humana. Sua presença se detecta inclusive na água potável que consumimos em casa, apesar de níveis bem baixos. Porém, se ingerirmos água com antibióticos constantemente, “se pode induzir resistência aos microorganismos, de maneira que o medicamento não fará mais efeito quando realmente for necessário”, afirma o investigador.
Outro problema são os estrógenos, atuando como disruptores endócrinos mesmo quando em concentrações muito baixas, de apenas 1 ng/L. No rio Llobregat foram detectados 10 vezes mais do composto estriol: 10 ng/L. Este rio, por ser mas curto, é o mais prejudicado porque, devido ao seu tamanho, possuir um nível maior de concentração química.
Como solucionar este tipo de contaminação? A legislação não ajuda porque não existe nenhuma regulação européia sobre as concentrações de fármacos.
A prevenção é outro fator importante. Na Alemanha, os médicos são informados sobre o grau de persistência ambiental dos medicamentos, para que eles possam precrever os de menor impacto ambiental. As moléculas em questão são muito complexas, são desenhadas para serem ativas e para que não sejam degradadas facilmente.
Este assunto se torna ainda pior já que a população envelhece e o consumo de medicamentos está aumentando.
Antibióticos e analgésicos
Os restos de fármacos que têm sido encontrados com maior frequência nos pontos de controle situados ao largo do rio Ebro são os reguladores lipídicos: o ácido clofíbrico e o gemfibrozil, que se detectam entre 100% e 80%, respectivamente, nas estações de amostragem. Seguem-se outras três sustâncias anti-inflamatórias e analgésicos: acetaminofem, diclofenaco e naproxeno, detectadas em nada mais que 60% das estações. E anti-inflamatório ibuprofeno, o anti-epiléptico carbamazepina e o antibiótico azitromicina se observan em 60% dos puntos de controle, seguidos do beta-bloqueador atenolol (50%).
As maiores concentrações detectadas no rio Ebro são beta-bloqueadores atenolol e o acetaminofeno (componente básico del paracetamol), compostos que alcançam níveles de 250 ng/L de água.
Seguidos pelo anti-inflamatório ibuprofeno e o anti-epiléptico carbamazepina, que alcançam concentrações de 110-150 ng/L de água.
O estudo de restos farmacológicos forma parte do projeto europeu Aquaterra, que também estuda a situação em otros cursos fluviais, como o Danúbio, o Elba e o Mosel.
*Este artigo foi publicado em 2009 no site www.brasileirosnaholanda.com
**Miriam Sommer, médica epidemiologista clinica e médica homeopata, reside na Holanda (
http://www.miriamsommer.nl/)
Fonte: http://www.ecomedicina.com.br/site/conteudo/artigo7.asp